De frente com Álvares de Azevedo



BIOGRAFIA

“A minha história é fantasia sim, porém amei-a”.

Juiz – Manuel Antônio Álvares de Azevedo, nascido em São Paulo, a 12 de setembro de 1831, solteiro, estudante de Direito, e filho legítimo do doutor Manuel Álvares de Azevedo, é acusado de ter sido e continuar sendo figura contraditória e mítica na literatura brasileira.
         Teria mesmo nascido na sala da biblioteca da Faculdade de Direito?
         Teria de fato sido puro e casto, dedicado exclusivamente à mãe e à irmã, configurando um Èdipo não resolvido, como diria a psicologia moderna?
         Teria sido realmente um gênio?
         Foi anjo e demônio do Romantismo, antecipador de elementos modernos na poesia brasileira? 
         De que teria morrido? Tuberculose, tumor, apendicite?

Leitura dos autos

Escrivão – Por ocasião do sesquicentenário de nascimento de Manuel Antônio Álvares de Azevedo, este tribunal promove o julgamento do poeta.
         Segundo afirmação de seus biógrafos, teria nascido a 12 de setembro de 1831, na sala da biblioteca da Faculdade de Direito de São Paulo; averigou-se, porém, ter nascido na casa de seu avô materno, Severo da Mota, à rua Quintino Bocaiúva, esquina da Senador Feijó.
         Em 1833, em companhia de seus pais, mudou-se para o Rio de Janeiro, em 1840, ingressou no colégio Stoll, onde consta ter sido excelente aluno, à exceção de ginástica. Em 1844 retornou a São Paulo em companhia de seu tio para, novamente, regressar ao Rio em 1845, onde entrou para o internato do Colégio Pedro II.
         Em 1º de Março de 1848, sob o registro nº 7, matriculou-se na Faculdade de Direito de São Paulo, vindo no entanto a falecer antes de concluir o curso. Entre seus contemporâneos, encontravam-se José Bonifácio (o moço), Aureliano Lessa e Bernardo Guimarães – estes dois últimos suas maiores amizades em São Paulo, com os quais consta ter constituído uma república de estudantes na Chácara dos Ingleses.
Ainda durante o ano de 1848 fez uma imitação do 5º ato de Otelo, de Shakespeare, uma tradução da Parisina de Byron e iniciou O Conde Lopo, conforme comprova carta ao amigo Luís Antônio da Silva Nunes, de 23 de agosto de 1848.
Entre 1848 e 1851, escreveu quase toda a sua obra, participou de várias atividades acadêmicas, entre as quais a fundação da revista Ensaio Filosófico, e proferiu as orações fúnebres por ocasião dos enterros de dois companheiros de escola, cujas mortes teriam enchido de presságios o seu espírito.
Às 17 horas do dia 25 de abril de 1852, domingo da Ressurreição, faleceu, devido ao agravamento de moléstia: talvez um tumor na fossa ilíaca, ocasionando por uma queda de cavalo, um mês antes. Outros diagnósticos atribuem sua morte à tuberculose, agravada devido ao tombo; segundo outros, teria sido apendicite a causa da morte do réu.
Produziu as seguintes obras: O Conde Lopo, Lira dos Vintes Anos, Poesias Diversas, O Poema do Frade, Macário, Noite na Taverna e o livro de Fra Condiciário, além de alguns estudos literários.
Terminada a leitura dos autos, tem a palavra o senhor promotor.

Acusação


Promotor – Álvares de Azevedo não é o que dizem. Não foi aquela figura angelical, pura e imaculada, fiel à figura feminina da mãe e da irmã; não foi excelente estudante... foi, sim, um indivíduo amante do conhaque, do charuto e das mulheres, como o atestam várias passagens de seus escritos. Sua obra é inspirada em escritores europeus malditos; como Byron, Musset, George Sand e outros; aliena-se da realidade brasileira e exalta paisagens estrangeiras de clima e estações definidas, penhascos, florestas e rei. Raros são os momentos em que se preocupa com coisas de sua pátria, exceção feita aos poemas “O Sertanejo”, “Pedro Ivo” e “Minha Terra”. Ademais, descreve orgias terríveis, usa freqüentemente do sarcasmo e da ironia e condena a mulher a um destino de virgem ou prostituta.
         Esta acusação chama agora a primeira testemunha, sua própria irmã, para depor sobre as condições de seu nascimento.

1º testemunha – “Álvares de Azevedo não nasceu no edifício da Faculdade de Direito (...). Nasceu em casa de seu avô materno, que era situada na antiga rua São Francisco, próxima da Academia...”.

2º testemunha – “Em Dezembro de 1848, em férias no Rio de Janeiro, mostra-se menos expansivo e cheio de apreensões quanto à morte. Neste período trabalha e lê intensamente. Byron é o seu maior tóxico, Também entra a fundo na floresta shakespeariana, em Goethe, Heine”.
Promotor – Mas Álvares de Azevedo foi além disso... Que o comprove o depoimento da próxima testemunha.

3º testemunha – “De Maneco Azevedo ouvi dizer que bebia quantidades enormes de conhaque ou de não sei que bebida muito forte que então estava em moda”.
Intervenção da galeria – “A vida está na garrafa de conhaque, na fumaça de um charuto de Havana, nos seios voluptuosos da morena. Tirai isso da vida – o que resta?”.

Promotor – Prosseguindo, esta promotoria chama ao tribunal sua quarta testemunha.
4º testemunha – “A mistura dos versos agudos e graves dá-se ainda nas estrofes regulares, pelo desleixo com a rima. È sempre variado o metro, sem que contudo leve ao extremo de usar dos chamados alexandrinos (...). Não raras vezes erra na afirmação dos versos pelo excesso ou falta do número de sílabas, quando não se socorre dos diminutivos para acaba-los de encher”.

O réu intervém – “Mas não vos pedirei perdão, contudo: Se não gostais desta canção sombria, Não penseis...”.

Juiz – Silêncio!
“Que me enterre em longo estudo”.
Por vossa alma fartar de outra harmonia!

Se vario no verso e idéias mudo
È que assim me desliza a fantasia...

Mas a crítica, não... eu rio dela...
Prefiro a inspiração da noite bela!

A crítica é uma bela desgraçada
Que nada cria nem jamais criará.”


Defesa


Advogado de defesa – Senhor juiz, senhor promotor, senhores jurados: “Sem querer ferir os talentos vivos, não podemos deixar de supor entretanto que Manuel Antônio Álvares de Azevedo tomaria como poeta um dos primeiros lugares na literatura de Portugal e do Brasil, se tão cedo não deixasse este mundo”.“Há nas obras do malfadado moço muito com que fazer esquecer os defeitos que a idade mais madura e a continuação do estudo teriam sem dúvida corrigido. O spleen que ele descreve melhor do que um inglês e que o acometia nas insônias do gênio, quando a fada noturna, a santa inspiração, abandonando-o, deixava de vir beijar aquela cabeça, prometedora de tanto futuro, combatia-o ele com o fumo de seu charuto, com as libações do conhaque, mais por imitação de Byron ou Alfred de Musset do que por necessidade real, pois o seu cérebro ainda fresco não precisava de excitações ardentes, para produzir, como esses estômagos inertes que só funcionam à força de cáusticas especiarias...”.

Advogado de acusação – Ao contrário: “Aborreceu-o a conquista fácil. Delirou em orgias. Baco por conselheiro teve aventuras loucas, perdulário da vida”.Vejam o que Satã, personagem sua, nos tem a dizer.

Satã – “Admira-me uma coisa. Tinha vinte anos: deveria ser puro como um anjo e era devasso como um cônego”.

Advogado de acusação – “Lamenta-se que o poeta em tão verdes anos se sentisse acometido do spleen de lorde Byron, tendo no coração a descrença de Alfred de Musset e nos lábios o sarcasmo de Henrique Heine”.

O réu volta a intervir – “Escutai-me, leitor, a minha história.
                                         È fantasia sim, porém amei-a
                                         Sonhei-a em sua palidez marmórea,
                                         Como a ninfa que volve-se na areia
                                         Com os lindos seios nus... Não sonho glória;
                                         Escrevi porque a alma tinha cheia
                                         - Numa insônia que o spleen entristecia -
                                        De vibrações convulsas de ironia!”

Juiz – Esta corte lembra mais uma vez que, se o réu não se mantiver de acordo com a ordem, será retirado desta coleção, digo, do recinto, o que, certamente, desapontará em muito seu público.
Advogado de defesa – “Tem defeitos e não poucos o talentoso poeta; deve-se-lhe porém levar em linha de conta que não foi ele quem publicou, nem quem reviu as suas obras. Bebendo as suas inspirações a largos tragos produziu muito e prometia ainda mais, senão muitíssimo...”
         “Não escolhia assuntos, não calculava, não meditava, aceitava a batalha sem plano, em qualquer terreno, certo de que a vitória lhe pertencia; e se alguma vez a meditação ou o estudo lhe indicavam o caminho que deveria seguir, a musa o transviava, e força era contentar-se com o que lhe dava a inspiração. Rara vez emendava. Assim, ele improvisava e escrevia ao correr da pena, embora depois não o possamos compreender... Acontece isso a esses colombos quando divagam por desconhecidos mares, sem a tenacidade do Ligúrio”.

Juiz – “Tendo em vista o depoimento das testemunhas e as provas paresentadas, convido agora os senhores jurados a, lendo profundamente as páginas do réu, darem seu veredicto...”.

Veredicto


Álvares de Azevedo – “Cuidado, leitos, ao voltar estas páginas!”.


CARACTERÍSTICAS DO AUTOR


“Oh! Deixe-me fumar o meu charuto”.

         Como começar a dizer coisas de Álvares de Azevedo, esse misterioso poeta? Que ele era um romântico em nossa literatura?
         Sim, claro, um romântico. Mas não um romântico qualquer. Nada menos do que um ultra-romântico, escrevendo entre o indianismo de Gonçalves Dias e os versos políticos inflamados de Castro Alves.
         Álvares de Azevedo foi ultra-romântico porque toda a sua obra transpira byronismo, satanismo, paixões exasperadas, saudades... Enfim, ingredientes que resultaram nessa obra quase sem fôlego escrita em tão pouco tempo.
         Mas é preciso tomar um pouco de cuidado ao ler o Maneco (apelido familiar do nosso poeta). Se por um lado foi Byron sua mola propulsora, por outro não se pode passar por cima de uma das maiores contribuições desse poeta à literatura brasileira: ele foi dos primeiros a utilizar a ironia como técnica poética e incorporar à sua poesia a descrição de objetos cotidianos como charuto, a lamparina, o conhaque, sua cama, seus livros. Era um banho de concretude e prosaísmo num período onde, para a literatura, tudo era fluido e esfumaçamento.
         Entre o indianismo de Gonçalves Dias (ainda tão amarrado ao Classicismo) e o engajamento político-literário dos abolicionistas e republicanos, situam-se alguns poetas cuja poesia costuma ser reconhecida pelo intimismo, saudosismo e satanismo, temas caracterizadores da poesia da chamada segunda geração romântica. Em suma, uma poesia introspectiva no conteúdo e livre na forma.
         Álvares de Azevedo é o maior dos poetas que tão bem caracterizaram essa fase aguda de nosso Romantismo, talvez exatamente por ter rompido um pouco o estereótipo ultra-romântico. Apesar de ter escrito poesias lacrimosas, melosas, tão carregadas de spleen, demonstrou uma veia sarcástica e brincalhona em boa parte de sua obra, como, por exemplo, no trecho abaixo, da cena “Numa Estalagem de Estrada”, da peça Macário, onde conversa com um serviçal sobre a mala que tinha amarrada ao burro:

Macário – Desate a mala de meu burro e tragam-na aqui...”.

A voz – O burro?

Macário – A mala, burro!

A voz – A mala com o burro?”

 

BRASILEIRISMO MALANDRO


         Surgido e desenvolvido no período da independência e de afirmação nacional, o Romantismo parece ligado às idéias verde-amarelas de brasilidade. Assim, falar em Romantismo é, de alguma maneira, falar também em nacionalismo. Mesmo porque o sentimento nacional era geral, ocorrendo não só na literatura brasileira como também na literatura (e na política) européia. Vários intelectuais europeus, aliás, tiveram importante papel na formação do Romantismo e dos românticos brasileiros: Almeida Garret, Alexandre Herculano, Ferdinand Denis e outros.
         Mas com Álvares de Azevedo a coisa foi diferente. Ou parece ter sido, à primeira vista. Mesmo que alguns de seus textos revelem pronunciamentos, digamos, brasileiros , como o discurso proferido por ocasião da instalação da Sociedade Acadêmica de Ensaio Filosófico, onde defende a necessidade de uma filosofia e literatura brasileiras, seus poemas mais conhecidos estão voltados para o cenário europeu, impregnados de imagens byronianas e shakespearianas, do céu da Itália – em suma, de um mundo distante das coisas do Brasil. Assim é que as personagens de Noite na Taverna, sem exclusão, vivem suas aventuras em terras e mares europeus, ora em castelos italianos e espanhóis, ora em fragatas inglesas.
         Teria assim o nosso Maneco rumado em sentido contrário à tendência geral do Romantismo?
         Aparentemente sim. Mas apenas aparentemente. Ocorre que o brasileirismo de Álvares de Azevedo se deu de outra maneira, não através da celebração de índios, palmeiras e onças, mas pelas vias do sarcasmo e da ironia, da descrição de suas coisas (idéias) íntimas, da sugestão da malandragem.
         Homem da cidade, ele não conheceu o Brasil floresta, mas a emergência do Brasil urbano. E aí é um percussor. Seus melhores escritos tratam de um Brasil próprio de um estudante de Direito, afeito à galhofa e à brincadeira.
         Desta maneira Álvares de Azevedo não só impregnou de brasilianismo alguns de seus textos, como foi dos primeiros a incorporar o caráter cordial do brasileiro, posteriormente tão celebrado na literatura.

O mito do super-homem


         Teria sido nosso poeta o superaluno que tanto louvam? O superfilho dedicado à mãe e à irmã, puro e casto? Talvez nem a pergunta nem a resposta sejam relevantes. Relevante seria perguntar se teria mesmo “Álvares de Azevedo sido o poeta excepcional, agudo e fino cantor de teatro, narrador prodigioso de contos fantásticos e terríveis, prosador numeroso, cheio de arranques magníficos, estofo de um crítico de rara agudeza em tão jovem idade?”.
         O que parece ter ocorrido, na verdade, foi ter Álvares de Azevedo, como tantos outros autores brasileiros, concentrado uma crítica marcada pelo verbalismo e louvação incondicional do poeta, que, dadas as condições em que viveu, acabou por transformar-se em mito. Nesse sentido, aponta Brito Broca ao analisar as origens da crítica no Brasil:
         “(...) a tendência para o verbalismo peculiar à nossa prosa romântica concorria para que  os artigos sobre livros e escritores nessa época derivassem, freqüentemente, para divagações em torno das obras e dos autores, fugindo ao que havia nestes de essencial. E como no Rio, em São Paulo e em Recife, quase todos eram amigos, formando-se em grupos ou em “capelinhas”, compreende-se que os artigos assumissem também, com freqüência, a feição de panegíricos. Elogiava-se desmesuradamente, sem poupar adjetivos, sem nenhum sentido de medida e de equilíbrio. Proliferavam os gênios entre nós durante o Romantismo.”
         Álvares de Azevedo não foi nem Deus nem o diabo, principalmente por que a literatura é feita por gente de carne e osso. E, mais ainda no caso do nosso Maneco, por gente que deixa no que escreve, além de traços de sua personalidade, as marcas fortes de seu tempo.

Que mimo! Que rosa, que filha de Deus!

“És tão doentia !
      Não corras assim!
         Donzela, onde vais?
        Tem pena de mim!”


         Um dos elementos mais constantes nos versos de Álvares de Azevedo foi a mulher. Ora virgem adormecida, pálida, inocente, inatingível objeto, ora prostituta da pior estirpe, como ouvimos de Satã, em Macário (“Têm uma lepra que ocultam num sorriso, Bufarinheiras de infância dão em troco do gozo o veneno da sífilis. Antes amar uma lazarenta!”), as mulheres povoam o universo alvaresiano numa obsessão adolescente. Como adolescente é o caráter onírico e irreal (além de irrealizável) das cenas em que participam essas figuras mágicas. Foi aliás, a constante da não realização do desejo em suas obras um dos fatores que construíram o mito da castidade em Álvares de Azevedo.

“Meu Deus! Por que sonhei, e assim por ela
                                  Perdi a noite ardente,
                                  Se devia acordar dessa esperança,
                                  E o sonho era demente? ...”

         Mas nem só em mulheres pensava Álvares de Azevedo. Versejou ainda sobre um outro tema, talvez com igual constância: a morte. Uma espécie prenúncio do trágico desfecho de sua vida; tema que o tomaria ainda mais “romântico”, pois trazia em si a expectativa da morte, como bem exemplificam os antológicos “Se eu morresse Amanhã” e “Lembrança de Morrer”. Morte que se transfigura ainda nas palavras pálido, palor, palidez, macilento, presentes em praticamente todos os poemas e páginas de prosa, transmitindo à obra e ao autor um aspecto doentio (tuberculoso?).
Uma outra maneira de o poeta aproximar-se da morte: o gosto pelo macabro, fantasmagórico, tão bem expressos n’ O Conde Lopo e na Noite na Taverna. Nessas passagens, povoadas de cadáveres, caveiras, castelos fantásticos, produzindo um estilo de época, caracteriza bem o tédio e o spleen românticos e sua proximidade com a morte.
         Mas não foi bem como poeta macabro, nem como o puro e casto Maneco que Álvares de Azevedo escreveu o melhor de sua obra, ainda que tenha sido nesses dois papéis que ele entrou para a história da literatura brasileira. Alguns de seus textos chegam a ser tão ruins que um crítico como Antônio Cândido chega até a supor que o poeta, se vivo fosse ao tempo da edição de suas obras, jamais os publicaria (refere-se ao Conde Lopo e ao Livro de Fra Condicionário).
         O grande mérito de Álvares de Azevedo foi, tendo sido o maior e mais famoso entre os ultra-românticos, o de Ter rompido um pouco o estereótipo ultra-romântico, desenvolvendo uma gostosa veia irônica e sarcástica, anunciando o que viria a ser uma constante no Modernismo.


ROMANTISMO


O primeiro volume continha a “Lira dos Vinte anos”, onde se encontra o melhor que criou; o segundo, enfeixava “Pedro Ivo”, “Macario”, “A noite na Taverna”, etc. Na Segunda edição, em três volumes (1862), acrescentou-se  o “Poema do Frade”. Em 1886, estampou-se “O conde Lopo”, depois incorporado à sua “opera omnia”, várias vezes dada a lume.



Vida e Obra de Álvares de Azevedo

Manuel Antônio Álvares de Azevedo (1831-1852) é o poeta de São Paulo, apesar de haver vivido algum tempo com a família no Rio de Janeiro e até estudado lá.
            Estudante da Faculdade de Direito de São Paulo (1848), não chegou a terminar o curso, morrendo vitimado por seqüências ocasionais por uma queda de cavalo.
            Sua biografia é caracterizada por contradições extremas: uns afirmam que ele foi uma criança pura, angelical, fixado na figura da mãe e da irmã – exemplos femininos que lhe serviriam de modelo moral e afetivo. Outros afirmam que Álvares de Azevedo foi, apesar de jovem, leitor de escritores europeus malditos, cantores do prazer e do pessimismo (Byron, Musset, George Sand etc.): o contato com essas leituras e o convívio com mulheres, bares, vida noturna, teriam amenizado a pureza original. Álvares de Azevedo vivia o clima europeu em São Paulo, o que justifica haver, em sua obra, apenas três poemas que falam de coisas da pátria: O Sertanejo, Pedro Ivo e Minha Terra.
            Angelical ou não, Álvares de Azevedo esteve em contato com a literatura pessimista européia e com a vida noturna de São Paulo, dela participando com a sensação própria da época, o “sleen”, o mal de um século em que as esperanças, os ideais e as ilusões são delírios e a morte é a única saída.
            A obra de Álvares de Azevedo é quantitativamente pequena. Afinal, o poeta morreu aos 21 anos. Escreveu poesias – Lira dos Vintes Anos (única obra cuja edição ele preparou e que foi publicada um ano após a morte do poeta) -, Macário, peça teatral em que há uma certa crítica à cidade de São Paulo, e Noite na Taverna, que compreende narrativas contadas por jovens amigos em torno de uma mesa numa taverna.
            Mas é sobretudo pela poesia que Álvares de Azevedo ficou famoso: as poesias ultra-romântica, de paixões exageradas, satânicas, byronianas, poesias em que o lirismo amoroso oscila entre a sensualidade e o ideal sagrado da mãe e/ou da irmão.
            O ambiente de São Paulo, as ruas, a noite, o charuto, a prostituta, a luz de lamparina, a cama, o conhaque, tudo isso faz parte de um cotidiano que ele introduz na poesia.


CROLOGIA BIOGRÁFICA

1831
A 12 de setembro, nasce Manuel Antônio Álvares de Azevedo, na casa de seu avô materno, muito próxima da Faculdade de Direito de São Paulo.
1833
Muda-se com à família para o Rio de Janeiro.
1835
Morre o irmão menor do poeta, o que o abala profundamente.
1840
Ingressa no colégio Stoll, onde se destaca como excepcional estudante.
1845
Transfere-se para o internato Pedro II, onde é aluno de Domingos José Gonçalves de Magalhães (professor de Filosofia).
1847
Conclui o curso no Cólegio Pedro II, onde se bacharela em letras.
1848
Matricula-se no 1º ano da Faculdade de Direito de São Paulo
1849
Faz discurso comemorativo do aniversário da criação dos cursos jurídicos no Brasil.
1850
Faz o discurso comemorativo da fundação da sociedade Ensaio Filosófico. Elabora o projeto (não realizado) de fundação de um jornal literário: Crepúsculo ou Estrela. Feliciano Coelho Duarte, também estudante de Direito, suicida-se.
1851
Morre João Batista da Silva Pereira, quintanista de Direito.
1852
Sofre um acidente (queda de cavalo), em março, cuja conseqüência é um tumor na fossa ilíaca. Morre a 25 de abril.
1853
É publicada a Lira dos Vinte Anos, única obra cuja edição o poeta preparara, e para a qual escrevera prefácios referentes à primeira a segunda partes.


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