O Modernismo


Um Clima Estético e Psicológico





O Modernismo surgiu no século XX e foi tido, então, como um código novo, bem diferente aos códigos parnasiano e simbolista. “Moderno” é um vocábulo ambíguo, para não dizer polissêmico. Designa o contemporâneo de quem fala ou escreve.
Neste momento aconteceram várias mudanças na literatura, não só no Brasil, mas também na Europa. Juntamente com a semana de 22, vinha também a I Guerra Mundial. A literatura estava em crise, tais notícias foram trazidas por escritores brasileiros, onde conheceram famosos poetas e pintores, alguns futuristas.


Introdução


A Semana de Arte Moderna ocorreu no Teatro Municipal de São Paulo, em 1922, tendo como objetivo mostrar as novas tendências artísticas que já vigoravam na Europa. Esta nova forma de expressão não foi compreendida pela elite paulista, que era influenciada pelas formas estéticas européias mais conservadoras. O idealizador deste evento artístico e cultural foi o pintor Di Cavalcanti.



1. Quadro Sinóptico


Alguns fatos ligados à Semana de Arte Moderna.

1909


- Manifesto de Fundação do Futurismo, publicado no jornal Le Figaro de Paris.

1911


- Fundação d’ O Pirralho por Oswald de Andrade.


1912


- Oswald de Andrade está na Europa por ocasião de publicação do Manifesto Técnico da Literatura Futurista.
- Primeiras colagens de Buarque e Picasso, possíveis origens do Cubismo.


1913


- Exposição de Lasar Segall em São Paulo.
- Apollinaire, “Sur la peinture”, espécie de manifesto cubista.


1914


- Início da Primeira Guerra Mundial.
- Duchamp lança os ready-mades, objetos dadaístas.
- Primeiros ensaios sobre o movimento expressionistas na pintura.



1915


- Ronald de Carvalho participa no Rio da fundação da revista Orfeu, dirigida em Portugal por Fernando Pessoa e Mario de Sá-Carneiro.


1917


- O surto industrial em São Paulo se acentua.
- Greve Geral em São Paulo – capital e interior.
- Vitória da Revolução Russa.
- Contato de Villa-Lobos com o compositor francês Darius Milhaud no Rio de Janeiro.
- Encontro de Oswald e Mario de Andrade.
- Segunda exposição de Anita Malfatti. Crítica de Monteiro Lobato.

1918


- Manifesto dadaísta.
- Manifesto da poesia expressionista.
- Fim da Primeira Guerra Mundial.


1919


- Criação do Fascismo na Itália e a adesão de Marinetti.
- Brecheret volta de Roma.
- Manuel Bandeira, Carnaval.


1920


- Washington Luís na presidência do estado de São Paulo.
- Brecheret expõe maquetes do Monumento às Bandeiras.
- Exposição de Anita Malfatti e John Graz.
- Oswaldo e Menotti fundam a revista Papel e Tinta.
- Graça Aranha, Estética da Vida.
- Freud começa a ser mundialmente reconhecido com o ensaio Além do princípio do prazer.


1921


- Manifesto do Trianon.
- Oswald de Andrade publica “Meu poeta futurista”, Mario responde com “Futurista?!”.
- Mario publica o artigo “Mestres do Passado”.
- Movimento ultraísta na Argentina, com Guillermo de La Torre e Jorge Luis Borges.
- Visita de André Breton a Freud.

1922


- Mussoline no poder.
- Revolta do Forte de Copacabana.
- Criação do Partido Comunista Brasileiro.
- Semana de Arte Moderna.
- Mario de Andrade publica, Paulicéia Desvairada; Oswald de Andrade, Os condenados.
- Fundação da revista Klaxon.



2. Antecedentes


Nos primeiros anos do século XX, inicia-se em São Paulo o processo de industrialização do país. Produziram-se, além de manufaturados, contingentes de trabalhas operários: homens, mulheres e crianças, que, submetidos às condições mais aviltantes de trabalho, ocupavam as fileiras de produção. Enquanto isso, a decadente elite do café, já deficitária, ostentava um alto padrão de vida, sustentado pela política dos governadores, que, para evitara a queda de preço do produto, compravam os excedentes, socializando apenas os prejuízos. A grande paralisação de operários, em 1907, a Revolta dos 18 do Forte de Copacabana, o Tenentismo, em 1922, somados aos ecos da Primeira Guerra Mundial (1914-1918), evidenciaram o esgotamento da estrutura de poder no primeiro quarto deste século no Brasil.
Junto com a estrutura sociopolítica, esgotara-se a arte que ela sustentava, de modo que, concomitante àqueles acontecimentos, os próprios artistas denunciavam a crise da cultura e da arte brasileira e a necessidade de sua transformação. Assim, antes mesmo da Semana de 22, são notáveis os seguintes eventos:

1912: Oswald de Andrade volta da Europa e começa a divulgar o Futurismo, de Marinetti, e a técnica do verso livre. Já no ano anterior fundada, com Emílio de Meneses, o jornal humorístico O Pirralho, em que Juó Bananere (Alexandre Marcondes Machado) parodiava, português dos ítalo-paulistanos, poemas célebres do Romantismo e do Parnasianismo.

1913: Lasar Segal realiza a primeira exposição de pintura moderna em São Paulo. Expõe quadros expressionistas e é totalmente ignorado.

1914: Anita Malfatti faz sua primeira exposição de pintura não-acadêmica. Uma série de artigos sobre o Futurismo sai em O Estado de S. Paulo.

1915: Fundação da revista Orfeu, que introduz o Modernismo em Portugal. Ronald de Carvalho, que participa da Semana, e Luís de Montalvor organizam no Rio o primeiro número da revista.

1917: Publicação de livros de estréia de futuros participantes da Semana:

- Há uma Gota de Sangue em Cada Poema, de Mario de Andrade, protesto pacifista contra a Primeira Guerra Mundial.
- Cinza das Horas, de Manuel Bandeira, “queixume de um doente d3esenganado”, segundo o próprio autor. No seu livro seguinte, Carnaval (1919), aparecia o poema satírico “Os Sapos”, que seria recitado na segunda noite da Semana de Arte Moderna.
- Moisés e Juca Mulato, de Menotti Del Picchia.
- Nós, de Guilherme de Almeida, ainda parnasiano e decadentista.
- A Flauta de Pã, de Cassiano Ricardo, com sonetos parnasianos.

Outros Eventos

Na música erudita, Villa-Lobos compõe o balé Amazonas, incluindo elementos do folclore brasileiro, influenciado por Stravinsky; na música popular, é gravado em disco um samba, Pelo Telefone, de Donga.

Exposição de 53 quadros de Anita Malfatti (1917), que provocou a dura crítica “Paródia ou Mistificação?”, de Monteiro Lobato, em O Estado de S. Paulo (20/12/1917). Segue-se o trecho da crítica:


“... Estas considerações são provocadas pela exposição da Sra. Anita Malfatti, onde se notam acentuadíssimas tendências para uma atitude estética forçada no sentido das extravagâncias de Picasso e companhia. Essa artista possui talento vigoroso, fora do comum. Poucas vezes, através de uma obra torcida para má direção, se notam tantas e tão preciosas qualidades latentes (...)”.

Por conseguinte, ocorreriam, nos anos seguintes, o surgimento de Victor Brecheret, a publicação de Carnaval, de Manuel Bandeira, a exposição de Di Cavalcanti, os artigos “Mestres do Passado”, em que Mario de Andrade analisa, criticamente, a poesia parnasiana.


3. Sacudindo as estruturas da arte tupiniquim



A Semana de Arte Moderna de 22, realizada entre 11 e 18 de fevereiro de 1922 no Teatro Municipal de São Paulo, contou com a participação de escritores, artistas plásticos, arquitetos e músicos.
Seu objetivo era renovar o ambiente artístico e cultural da cidade com "a perfeita demonstração do que há em nosso meio: em escultura, arquitetura, música e literatura, sob o ponto de vista rigorosamente atual", como informava o Correio Paulistano a 29 de janeiro de 1922.
A produção de uma arte brasileira, afinada com as tendências vanguardistas da Europa sem, contudo, perder o caráter nacional, era uma das grandes aspirações que a Semana tinha em divulgar.

4. Independência e sorte


Esse era o ano em que o país comemorava o primeiro centenário da Independência e os jovens modernistas pretendiam redescobrir o Brasil, libertando-o das amarras que o prendiam aos padrões estrangeiros.
Seria, então, um movimento pela independência artística do Brasil.
Os jovens modernistas da Semana negavam, antes de mais nada, o academicismo nas artes. A essa altura, estavam já influenciados esteticamente por tendências e movimentos como o Cubismo, o Expressionismo e diversas ramificações pós-impressionistas.
Até aí, nenhuma novidade nem renovação. Mas, partindo desse ponto, pretendiam utilizar tais modelos europeus, de forma consciente, para uma renovação da arte nacional, preocupados em realizar uma arte nitidamente brasileira, sem complexos de inferioridade em relação à arte produzida na Europa.

5. Um grupo importante de renovadores


De acordo com o catálogo da mostra, participavam da Semana os seguintes artistas: Anita Malfatti, Di Cavalcanti, Zina Aita, Vicente do Rego Monteiro, Ferrignac (Inácio da Costa Ferreira), Yan de Almeida Prado, John Graz, Alberto Martins Ribeiro e Oswaldo Goeldi, com pinturas e desenhos;
Marcavam presença, ainda, Victor Brecheret, Hildegardo Leão Velloso e Wilhelm Haarberg, com esculturas; Antonio Garcia Moya e Georg Przyrembel, com projetos de arquitetura.
Além disso, havia escritores como Mário de Andrade, Oswald de Andrade, Menotti del Picchia, Sérgio Milliet, Plínio Salgado, Ronald de Carvalho, Álvaro Moreira, Renato de Almeida, Ribeiro Couto e Guilherme de Almeida.
Na música, estiveram presentes nomes consagrados, como Villa-Lobos, Guiomar Novais, Ernâni Braga e Frutuoso Viana.


6. Uma cidade na medida certa para o evento

São Paulo dos anos 20 era a cidade que melhor apresentava condições para a realização de tal evento. Tratava-se de uma próspera cidade, que recebia grande número de imigrantes europeus e modernizava-se rapidamente, com a implantação de indústrias e reurbanização.
Era, enfim, uma cidade favorável a ser transformada num centro cultural da época, abrigando vários jovens artistas.
Ao contrário, o Rio de Janeiro, outro pólo artístico, se achava impregnado pelas idéias da Escola Nacional de Belas-Artes, que, por muitos anos ainda, defenderia, com unhas e dentes, o academicismo.
Claro que existiam no Rio artistas dispostos a renovar, mas o ambiente não lhes era propício, sendo-lhes mais fácil aderir a um movimento que partisse da capital paulista.

7. Os primórdios da arte moderna no Brasil



Em 1913, estivera no Brasil, vindo da Alemanha, o pintor Lasar Segall. Realizou uma exposição em São Paulo, e outra, em Campinas, ambas recebidas com uma fria polidez. Desanimado, Segall seguiu de volta à Alemanha, só retornando ao Brasil dez anos depois, quando os ventos sopravam mais a favor.
A exposição de Anita Malfatti em 1917, recém chegada dos Estados Unidos e da Europa, foi outro marco para o Modernismo brasileiro. Todavia, as obras da pintora, então afinadas com as tendências vanguardistas do exterior, chocaram grande parte do público, causando violentas reações da crítica conservadora.
A exposição, entretanto, marcou o início de uma luta, reunindo ao redor dela jovens despertos para uma necessidade de renovação da arte brasileira.
Além disso, traços dos ideais que a Semana propunha já podiam ser notados em trabalhos de artistas que dela participaram (além de outros que foram excluídos do evento).
Desde a exposição de Malfatti, havia dado tempo para que os artistas de pensamentos semelhantes se agrupassem.
Em 1920, por exemplo, Oswald de Andrade já falava de amplas manifestações de ruptura, com debates abertos.


8. Semana de Arte Moderna



Patrocinada pela elite letrada doa quatrocentões paulistanos, a Semana “foi ao mesmo tempo, o ponto de encontro das diversas tendências modernas que desde a I Guerra se vinham firmando em São Paulo e no Rio, e a plataforma que permitiu a consolidação de grupos, a publicação de livros, revistas e manifestos, numa palavra, o seu desdobrar-se em viva realidade cultural[1]”. Ocorreu em três noites, 13, 15 e 17 de fevereiro de 1922, no Teatro Municipal de São Paulo.
Na primeira noite, Graça Aranha, que, como membro da Academia Brasileira de Letras, conferia ao evento um ar de respeitabilidade, profere a conferência “A Emoção Estética da Arte Moderna, ilustrada com poemas declamados por Guilherme de Almenida e Ronald de Carvalho, acompanhados por Ernâni Braga ao piano, executando, de Eric Satie, a paródia da Marcha Fúnebre de Chopin.
Na segunda noite, há a conferência de Menotti Del Picchia, ilustrada com vários textos, entre os quais “Os Sapos”, de Manuel Bandeira, variados todos pelo público. Segue-se um trecho da conferência:

“Queremos lua, ar, ventiladores, aeroplanos, reivindicações obreiras, idealismos, motores, chaminés de fábricas, sangue, velocidade, sonho na nossa arte. E que o rufo do automóvel, nos trilhos de dois versos, espante da poesia o último deus homérico, que ficou, anacronicamente, a dormir e a sonhar, na era do jazz band e do cinema, com a flauta dos pastores da Arcádia e dos seios de Helena!”

Mario de Andrade, sob vaias, lê poemas que constituíram o livro A Escrava que não é Isaura, Renato de Almeida critica o Parnasianismo e Villa-Lobos entra no palco de chinelos (pois teria um calo no pé) e guarda-chuva, indignando o público.
A terceira noite tem apenas programa musical e Villa-Lobos rege composições do reduzido público, que aplaudiu, sem escândalos.
O escritor Graça Aranha (1868-1931) aderiu abertamente à Semana da Arte Moderna, criando uma cisão na quase monolítica Academia Brasileira de Letras e gerando nela uma polêmica como há muito tempo não se via.
Dois grupos de imortais se engalfinhavam, um deles liderado por Graça Aranha, que pretendia romper com o passado. O outro, mais sedimentado na velha estrutura, tinha como seu líder o escritor Coelho Neto (1864-1934). Os dois nordestinos, os dois maranhenses, os dois com uma força tremenda junto a seus pares. Eram conterrâneos ilustres, que agora não se entendiam, e que pretendiam levar suas posições até as últimas conseqüências.
Então, numa histórica sessão da Academia, no ano de 1924, deu-se o confronto fatal. Após discursos inflamados e uma discussão áspera entre ambos, diante de uma platéia numerosa, um grupo de jovens carregou Coelho Neto nas costas, enquanto outro grupo fazia o mesmo com Graça Aranha.
Em suma, Mário de Andrade, com suas conferências, leituras de poemas e publicações em jornais foi uma das personalidades mais ativas da Semana. Oswald de Andrade talvez fosse um dos artistas que melhor representavam o clima de ruptura que o evento procurava criar. Manuel Bandeira, mesmo distante, provocou inúmeras reações de agrado e de ódio devido a seu poema "Os Sapos", que fazia uma sátira do Parnasianismo, poema esse que foi lido durante o evento.






9. A imprensa, controlada, ignorou o "escândalo"

Arte Moderna
(Terno Idílio
[1])

A Gazeta concede-me benfeitora as suas páginas para que nelas diga sobre a Semana de Arte Moderna. Quero, antes de mais nada, exaltar a magnanimidade com que me acolhe a redação. Por um mal-entendido de crítica foram violentamente separados há dois anos, eu, plumitivo incipiente, e A Gazeta, senhora de nobre e popular carreira.
(...) Apenas me permito retificar uma pequena confusão de Cândido. O que vai realizar-se é bem uma Semana de Arte Moderna. (...) Desejamos apenas ser atuais. (...) Há exageros em nossa arte? É natural. Não se constrói um aranha-céu sobre um castelo moçárabe. Derruba-se primeiro a mole pesadíssima dos preconceitos, que já foram verdades, para elevar depois outras verdades, que serão preconceitos para um futuro, quiça muito próximo. (...) Depois do pranto de todo um século romântico, “coroado” nos espinhos duma guerra tremenda, queremos rir e livremente rir! Batam os sinos! É sábado de aleluia! Não me pesa ser o Judas desse sábado, contanto que me deixem sorrir aos leitores d’A Gazeta, no dia que refloresce para mim o terno idílio.

Mário de Andrade

A Gazeta, São Paulo, 3 de fevereiro de 1922, p.1 (coluna “Notas de Arte”).

O Futurismo

Não foi, pois, sem um certo regozijo íntimo que vimos ontem a assinatura do Sr. Mário de Andrade na mesma coluna que colaboramos, discretamente sobre o reatamento de suas relações com A Gazeta e prometeu dizer os intuitos da próxima Semana de Arte Moderna.
(...) Ao tratarmos da questão futurista, não nos move felizmente nenhum preconceito de escola ou qualquer animosidade pessoal. Em matéria de arte, acima dos agrupamentos, das escolas ou das chamadas igrejinhas, colocamos a personalidade do artista e o cunho original que ele imprimir à sua obra.
Pondo, porém, de lado esse conceito a que não podemos dar hoje o desenvolvimento devido, aqui deixamos consignados novamente os nossos votos de boas-vindas ao Sr. Mário de Andrade.

Cândido

A Gazeta, São Paulo, 4 de fevereiro de 1922, p.1 (coluna “Notas de Arte Futurista”).


A Semana Futurista

A Semana de Arte Moderna, a realizar-se proximamente no Teatro Municipal, vem agitando de tal forma o nosso meio artístico e intelectual que se conservar alheio a esse movimento seria dar provas de um parti pris que não se coaduna absolutamente com o grau de progresso e que atingiu a imprensa moderna.
A Gazeta, que tem acompanhado com interesse todas as questões que se levantam em nossos centros artísticos e intelectuais, inicia hoje a publicação da colaboração do Sr. Mário de Andrade em defesa da arte moderna, ao mesmo tempo insere a continuação da série de considerações que Cândido vem fazendo acerca do futurismo.
Dito isto, inútil se torna acrescentar as nossas colunas continuam abertas a quantos quiserem discutir o assunto em debate.

A Gazeta, São Paulo, 3 de fevereiro de 1922, p.1.

O Vagabundo Borra-Telas[2]

Fica por aí, copiando oleografias, sem cultura, sem estudos, sem orientação. É quando uma Malfatti, depois de honrar o nome brasileiro nos mais adiantados ateliês do Velho Mundo e do Novo Mundo, apresenta o fruto glorioso de seus estudos, de sua severa aplicação, de sua rigorosa pesquisa estética, é ele o vagabundo borra-telas, o mais irritado, o mais nervoso e o mais maldizente que aparece.
Os outros, os indiferentes, os negocistas, as senhoras que sabem se vestir, as meninas que estudam álgebra, esses ouvem fazer naquilo ao jantar e apóiam. Formada a corrente, explode a bombarda no primeiro atrevimento jornalístico. E fica decidido que a cidade e o país continuarão a pensar com atraso, a sentir com atraso, a ver com atraso.
O benefício feito agora pela cultura de Graça Aranha e Paulo Prado, os verdadeiros organizadores de arte moderna que se prepara no Municipal, era urgente.
(...) Já não se dirá, depois do veredicto de Graça Aranha, que a de Mario de Andrade, a pintura de Di Cavalcanti, a escultura de Brecheret e a música de Villa-Lobos são casos de excepcionabilidade mórbida ou reclamista. E a Semana de Arte Moderna virá mostrar como esses espíritos de vangarda são apenas os guias de um movimento tão sério que é capaz de educar e curá-lo do analfabetismo letrado em que lentamente vai para trás.

Oswald de Andrade

Jornal do Commercio, São Paulo, 9 de fevereiro de 1922, PP. 5 e 6 (coluna “Semana de Arte Moderna”).
[1] Idílio: sm 1. Pequeno poema pastoril. 2. Amor poético e suave.
[2] Título atribuído ao texto publicado na coluna “Semana de Arte Moderna”.
Entretanto, acredita-se que a Semana de Arte Moderna não tenha tido originalmente o alcance e amplitude que posteriormente foram atribuídos ao evento.
A exposição de arte, por exemplo, parece não ter sido coberta pela imprensa da época. Somente teve nota publicada por participantes da Semana que trabalhavam em jornais como Mário de Andrade, Menotti del Picchia e Graça Aranha (justamente os três conferencistas, cujas idéias causaram grande alarde na imprensa).
Yan de Almeida Prado, em 72, chegou mesmo a declarar que “a Semana de Arte Moderna pouca ou nenhuma ação desenvolveu no mundo das artes e da literatura", atribuindo a fama dos sete dias aos esforços de Mário e Oswald de Andrade.
10. Bem intencionados, mas ainda confusos

Além disso, discute-se o "modernismo" das obras de artes plásticas, por exemplo, que apresentavam várias tendências distintas e talvez não tivessem tantos elementos de ruptura quanto seus autores e os idealizadores da Semana pretendiam.
Houve ainda bastante confusão estilística e estrangeirismos contrários aos ideais da amostra, como demonstram títulos como "Sapho", de Brecheret, "Café Turco", de Di Cavalcanti, "Natureza Dadaísta", de Ferrignac, "Impressão Divisionista", de Malfatti ou "Cubismo" de Vicente do Rego Monteiro.


10. Desdobramento da Semana de Arte Moderna


A revista Klaxon, Mesário de Arte Moderna, durou de maio de 1922 a fevereiro de 1923. Reunindo os modernistas da fase heróica, não sobreviveu à divisão entre a corrente dinamista, adepta do futurismo, da técnica, da velocidade, da experimentação de uma linguagem nova, e a primitivista, chegada ao expressionismo e à exploração do folclore brasileiro. Dividida entre a ânsia de modernização do Brasil e a civilização de que nossas raízes indígenas e negras precisavam de tratamento estético adequado, a revista, incongruente na aparência, é o fundamento de obras como Macunaíma, Pau-Brasil, Cobra Norato, Martim Cererê, Revista de Antropofagia, Memórias Sentimentais de João Miramar, etc.
A revista Estética, dirigida por Sérgio Buarque de Holanda e Prudente Morais Neto, foi lançada em 1924 e teve três números fartos de material teórico. Nessa revista, a disputa era entre “arte interessada” e “arte autônoma”.


11. A dispersão

Logo após a realização da Semana, alguns artistas fundamentais que dela participaram acabam voltando para a Europa (ou indo lá pela primeira vez, no caso de Di Cavalcanti), dificultando a continuidade do processo que se iniciara.
Por outro lado, outros artistas igualmente importantes chegavam após estudos no continente, como Tarsila do Amaral, um dos grandes pilares do Modernismo Brasileiro.
Não resta dúvida, porém, que a Semana integrou grandes personalidades da cultura na época e pode ser considerada importante marco do Modernismo Brasileiro, com sua intenção nitidamente anti-acadêmica e introdução do país nas questões do século.
Por fim, a própria tentativa de estabelecer uma arte brasileira, livre da mera repetição de fórmulas européias foi de extrema importância para a cultura nacional e a iniciativa da Semana, uma das pioneiras nesse sentido.

12. Nove nomes do Modernismo

Anita Malfatti: sua exposição chamada Primeira Exposição de Arte Moderna no Brasil, 1917-1918, aberta em dezembro de 1917, foi o começo do movimento que eclodiu na Semana de Arte Moderna de 1922.

Di Cavalcanti: Na 1ª Bienal de São Paulo, em 1951, Di Cavalcanti expôs como convidado especial. Já na 2ª Bienal, recebeu, ao lado de Alfredo Volpi, o prêmio de melhor pintor nacional.

Graça Aranha: Canaã, romance baseado na experiência do escritor como juiz no Espírito Santo, lançado em 1902, foi o marco inicial do Pré-Modernismo, fase da literatura brasileira cuja principal proposta é a "redescoberta do Brasil" por meio da denúncia da realidade brasileira.

Oswald de Andrade: O movimento Pau Brasil se deu em 1924 e o Movimento Antropofágico em 1928. Ambos tiveram a divulgação do programa estético feito por Oswald. Filiou-se ao PCB, em 1930, após a revolução, e rompeu com o mesmo em 1945. Continuou, porém, sendo de esquerda.

Villa-Lobos: Promoveu as primeiras apresentações de suas obras na Semana de Arte Moderna de 1922. Nos anos seguintes, teve uma importante atividade como educador e divulgador musical. Uma de suas contribuições foi a criação da Orquestra Villa-Lobos.











































Tarsila do Amaral: Manteve contato com Mário de Andrade, Oswald de Andrade, Anita Malfatti e Menotti Del Picchia, com os quais formou o chamado "Grupo dos Cinco", grupo responsável pelo início do modernismo no país.

Manuel Bandeira: Em 1922, integrou-se ao grupo que fez a Semana de Arte Moderna. Dois anos depois, em Ritmo Dissoluto, passou a praticar a nova estética em sua poesia.

Mário de Andrade:
Em 1922 viria à luz sua primeira obra modernista: Paulicéia Desvairada. É também neste ano que Mário teria uma participação fundamental na Semana de Arte Moderna, sendo considerado um de seus mentores.
Considerações Finais

Polêmicas divulgadas na imprensa no decorrer do ano de 1922, quando um pequeno grupo de artistas e escritores, liderados por Oswald de Andrade e Mário de Andrade, difamava as nossas glórias artísticas ditas de “praça pública”, em razão da imitação servil, ou, como era alardeado, da “cópia sem coragem e sem talento”. Contra “esses falsos mitos” e, sobretudo, na busca da emancipação cultural levantava-se o então chamado futurismo paulista, a quem a respeitabilidade de Graça Aranha dera “a mão forte”. Aos gritos de “Independência! Originalidade! Personalidade!” começou-se a mudar o panorama das nossas artes. Através de propostas controvertidas, o “caloroso tumulto de idéias” teve sua primeira face pública com a Semana de Arte Moderna, realizada de 13 a 18 de fevereiro de 1922.
Essa Semana tão comemorada não inaugurou o movimento, foi apenas a festa planejada para anunciar o engatinhar de uma nova mentalidade, e os resultados vibrado em silêncio com as ousadias de O Homem Amarelo e de A Boba, de Anita Malfatti, depois de um longo processo de aprendizagem sobre arte moderna e de arregimentação de novos companheiros. NA sua coluna no jornal do Commercio (1921), Oswald vislumbrava em São Paulo, a formação de um “núcleo de reação ao caruncho dos processos acadêmicos da literatura e arte”. Artistas e escritores também encontram na Semana uma maneira adequada de comemorar os cem anos da Independência política do Brasil, conforme também havia anunciado Oswald: “Um pugilo pequeno, mas forte, prepara-se para valer o nosso Centenário”.

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