Biografia de Machado de Assis

Joaquim Maria Machado de Assis nasceu no Morro do Livramento, no Rio de Janeiro, a 21 de junho 1839, filho de um pintor mulato, Francisco de Assis, e uma lavadeira portuguesa, Maria Leopoldina Machado de Assis.
Nos primeiros anos, com certeza, o menino freqüentou a Chácara do Livramento, sob a proteção da madrinha, senhora muito rica, dona da propriedade.
Aos seis anos, presenciou a morte da única irmã. Quatro anos depois, morreu-lhe a mãe. Seu pai casou-se, novamente, em 1854, com Maria Inês.
Órfão de ambos muito cedo, foi criado pela madrasta. Já na infância apareceram sintomas de sua frágil compleição nervosa, a epilepsia e a gaguez, que o acometiam a espaços durante toda a vida e lhe deram um efeito de ser reservado e tímido. Aprendeu as primeiras letras numa escola pública.
Aos quatorze anos, encontramos Machado ajudando a madrasta a vender doces para o sustento da casa. Sabemos que numa sociedade marcada por divisões sociais muito rígidas – como já era o Brasil na época de Machado – o indivíduo já nasce com seu destino social mais ou menos determinado pela origem, pela raça, e até pela possibilidade ou não de freqüentar escolas. Machado, como menino de subúrbio, pobre e mulato, tinha todas as chances do mundo de não vencer, mas com ele foi diferente.
A vida intelectual dos meninos do subúrbio era muito diferente aos da Corte. As coisas mais elegantes do Rio de Janeiro aconteciam na Rua do Ouvidor, onde as pessoas das classes superiores se encontravam, se divertiam, exibiam suas roupas importadas da Europa. E, era nesta rua que Machado passava grande parte do seu tempo, claro, trabalhando. Fora caixeiro de livraria, tipógrafo, e outras mais.
Após os estudos elementares, dedica-se a vários empregos a fim de auxiliar no sustento da família. Não era fácil, pois havia ainda o preconceito racial, sendo ele mulato. Conhece Paula Brito e estréia um soneto, publicado no Periódico dos Pobres, de 3 de outubro de 1854.
No dia 6 de janeiro de 1855 a Marmota Fluminense – jornal de notícias, variedades e curiosidades e literatura – publicou o poema de Machado de Assis, “A palmeira”. Logo Machado se tornou um membro da redação deste jornal. Fez amizade com um padre, Silveira Sarmento, de quem recebeu aulas de francês e de latim; mas foi como autodidata que construiu sua vasta cultura literária que incluía autores menos lidos no tempo como Swift, Sterne e Leopardi.
Com dezessete anos, ingressa como aprendiz de tipógrafo na Imprensa Nacional, onde ganha a amizade de Manuel Antônio de Almeida, um romancista já famoso na época. Em 1858, trava contacto com expoentes literários do tempo, e deles recebe estímulo para continuar a escrever. Passado um ano, entra no Correio Mercantil, como revisor e colaborador.
Publicou seu primeiro livro, poesias, em 1864: Crisálidas. Em 1867, foi nomeado para o cargo de ajudante do diretor do Diário Oficial.
Em 12 de novembro de 1869, casa-se com Carolina Xavier de Morais, de nacionalidade portuguesa e mais velha que ele. Viveram juntos 35 anos, em perfeita harmonia.
No ano seguinte ao casamento publicou o primeiro volume de Contos Fluminenses. Nesse meio tempo escreveu os romances que fazem parte da primeira fase machadiana – a fase romântica.
Quatro anos mais tarde é nomeado primeiro oficial da Secretaria de Estado do Ministério da Agricultura, Comércio e Obras Públicas. Publicou, também, outro volume de contos: Histórias da meia-noite.
Em 1878 e 1879, Machado de Assim passou uma temporada em Friburgo, por motivo de doença. Em 1881, foi nomeado Oficial de Gabinete de Pedro Luís, ministro da Agricultura.
Em 1882, lançou o terceiro volume de contos: Papéis Avulsos. Dois anos depois publicou: Histórias sem data.
Em 1888, foi nomeado Oficial da Ordem da Rosa, por decreto do Imperador. No ano seguinte, o de Diretor da Diretoria do Comércio. Em 1892, foi Diretor geral da Viação.
Em 15 de dezembro de 1896 funda, com outros escritores, a Academia Brasileira de Letras, e torna-se seu primeiro presidente, animou a excelente Revista Brasileira, promoveu os poetas parnasianos e estreitou relações com os melhores intelectuais de seu tempo, de Veríssimo a Nabuco, de Taunay a Graça Aranha. Não obstante essa ativa sociedade no mundo literário, ficava proverbial a fria compostura pessoal e o absenteísmo político que manteve nos derradeiros: atitude paralela à análise corrosiva a que vinha submetido o homem, mais “diplomático”.
Em 1899, publica Páginas recolhidas, e assim sucessivamente. Alcança a estabilidade econômica, entrega-se à criação de sua obra, numa sucessão apenas interrompida pela morte. Enquanto isso foi ascendendo na burocracia chegando ao fim da vida a diretor-geral da Contabilidade do Ministério (1902).
Em 1904, foi aceito como Membro correspondente da Academia das Ciências, de Lisboa. No mesmo ano, coroado de glória e admiração, experimenta a mágoa de perder Carolina a dois de outubro, e principia a morrer.
Apesar da serenidade que o escritor aparentava, o prazer de viver tinha mesmo acabado com a ausência de Carolina. Acometido de doenças: vista fraca, infecção intestinal e uma úlcera na língua.
No dia 1 de agosto vai à Academia Brasileira de Letras pela última vez. Lúcido, recusando a presença de um padre, manteve a coerência de quem nunca tinha sido religioso.
Em junho de 1908, tirou licença para tratamento de saúde. Mas, falece vitimado por uma úlcera cancerosa, aos 69 de idade, às 3horas e 20 minutos da madrugada do dia 29 de setembro de 1908.
Declara-se luto oficial em todo o Rio de Janeiro. Seu enterro, com enorme acompanhamento de figuras conhecidas e do povo, atesta a fama que Machado havia alcançado. Foi sepultado ao lado de Carolina.
Assim, cercado de amigos fiéis, fora sepultado. Na Academia, coube a Rui Barbosa fazer-lhe o elogio fúnebre.
Os biógrafos de Machado de Assis tendem a exagerar seus sofrimentos, enfatizando as causas eventuais de seu tormento físico, psicológico e social: a cor escura, a origem humilde, a orfandade na primeira infância, a compleição, a doença nervosa, a carreira difícil nos primeiros anos, a esterilidade, as humilhações, o complexo de rejeição etc. Tudo isso serviu de “projeções” psicológicas na obra do autor, fruto do psicologismo que invadiu a crítica literária dos anos 30 e 40, ou da tendência romântica de se atribuir aos grandes escritores uma quota pesada e ostensiva de sofrimento e de drama, pois a vida normal parece incompatível com o gênio artístico. Não podemos afirmar com clareza se realmente tudo isso é verdade, ou se há um pouco de exagero, mas a única coisa que podemos afirmar é que Machado é um dos maiores escritores Brasileiros.
Historicamente, podemos dizer que, Talvez, os seus sofrimentos podem não ter parecido ter excedido aos de toda gente, nem sua vida ter sido tão árdua. Sabemos que no Império liberal, muitos homens de cor negra foram guinados ao Ministério, ou receberam títulos de nobreza, ou conheceram notável ascensão social.
Resumindo, Machado ascendeu com facilidade na vida pública: tipógrafo, repórter, funcionário modesto, alto funcionário, casou-se com uma senhora branca, culta, amiga discreta, afetuosa, íntima de gente ilustre e bem-nascida. Aos cinqüenta anos, considerado o maior escritor do país, objeto de uma reverência e admiração que nenhum escritor brasileiro conheceu em vida, antes e depois dele. Quando se cogitou na fundação da Academia Brasileira de Letras (1897), Machado foi escolhido seu mentor e presidente, porto que exerceu até morrer. Presidente perpétuo da Casa de Machado de Assis e seu único imortal, esta, converteu-se numa espécie de patriarca das Letras.
Obras

As obras machadianas são: Ressurreição (1872), A Mão e a Luva (1874), Helena (1876), Iaiá Garcia (1878), Memórias Póstumas de Brás Cubas (1881), Quincas Borba (1891), Dom Casmurro (1899), Esaú e Jacó (1904), Memorial de Aires (1908); o conto: Contos Fluminenses (1970), Histórias da Meia-Noite (1873), Papéis Avulsos (1882), Várias História (1896), Páginas Recolhidas (1899), Relíquias de Casa Velha (1906), etc.; o teatro: Queda que as Mulheres têm pelos Tolos (1861), Desencantos (1861), Teatro (1863), Os Deus de Casaca (1866), Tu, só Tu, Puro Amor (1881); a crônica: A Semana (1914), etc.; a crítica: Crítica (1910).
As duas Fases Machadianas

Tornou-se convencional a divisão da obra machadiana em duas fases. Tais fases têm sido apontadas, convencionalmente, na carreira de Machado de Assis, a romântica, que enfeixa os romances desde Ressurreição até Iaiá Garcia, portanto a criação literária entre 1870 e 1880; e a realista, após as Memórias Póstumas e Brás Cubas.
Divisão esclarecedora, e de certo modo valorativa, dado que a segunda fase engloba as obras mais acabadas do engenho de Machado de Assis, não espelha, porém, toda a verdade. A rigor, se há predominância da pigmentação romântica nos livros iniciais, lá também se observam traços de heterodoxia, a revelar um temperamento que aderiu com reservas à estética romântica, e nele instilou a marca de inconfundível talento. Por outro lado, as duas fases ligam por osmose, e não só por aspectos da primeira transitam para a segunda, como naquela já se divisam pormenores caracterizados desta. Os momentos da trajetória do escritor seriam assinalados por uma unidade ou continuidade, nada surpreendente se lembrarmos que a obra de qualquer escritor, por mais variação que apresenta, é sempre dominada pelas mesmas forças-motrizes. As fases machadianas refletiram, à luz dessa observação, as modulações ascendentes da mesma cosmovisão: na primeira, o escritor ensaia os passos iniciais, ainda vacilantes a cerca do ruma a perseguir, mas intui, por entre a bruma da incerteza, o alvo a atingir; e na fase seguinte, vencidos os tateios, amadurece a visão do homem e do mundo. Sucede, pois, que uma análise global da obra de Machado de Assis mostra, à sociedade, que sua concepção da realidade já se desenha, ainda que embrionariamente, na primeira fase. Em suma, as latências das obras da juventude se cumprem na maturidade.

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